O BARULHO DO MUNDO - Cap III

_ Foi assim durante muitos e muitos anos! Essa vila era grande o suficiente para todos os seus habitantes, todos eram amigos, aqui reinava a paz e a alegria... Havia muitos peixes no mar, havia trabalho para todos, professores dispostos a ensinar nossas crianças... O seu mundo imaginário também era assim não era?

_Era Senhora! Impressionante como a Senhora o descreveu agora para mim. Foi como o tivesse tirado de minha memória nesse mesmo instante!

_ Mas um dia, um homem diferente dos que aqui moravam, veio ter aqui. Ele contava histórias  maravilhosas de outros lugares, seus ouros, suas pedras preciosas e o estrago que o dinheiro podia fazer na vida das pessoas... Os homens daqui da vila, que nunca haviam visto aquelas notas verdes, vermelhas, azuis, amarelas, ficavam fascinados por seu alto poder junto ao homem. As mulheres foram corrompidas de sua vida simples, para a beleza dos tecidos finos e a pintura para seus rostos. As crianças ficavam fascinadas ante os "novos brinquedos" trazidos pelo homem... Todos nessa vila foram corrompidos por valores nunca antes almejados por aqueles habitantes!

A inveja, a cobiça, o ódio, passou a rondar a vida das pessoas da vila! Com o passar dos tempos, ninguém reconhecia ninguém, nem todos eram amigos e muitos se perderam para os prazeres da vida!

_ E... Conte mais Senhora! Disse a criança que no decorrer da narrativa havia substituído a expectativa em seu rostinho por uma sensação de tristeza extrema.

_ Muitos forma embora para a cidade grande... Muitos homens e mulheres abandonaram tudo em busca dos prazeres da vida! Aqui ficavam os velhos e as crianças! Os velhos porque não tinham forças para irem embora e as crianças porque iam "dar trabalho" aos pais.

_ Mas se aqui haviam ficado os velhos e as crianças, onde estão todos?

_ Isto foi há muito tempo criança! Muitos e muitos anos... Há princípio, a vila ficou muito cheia de velhos e crianças. E os velhos faziam as vezes de pescadores para alimentar a todos.  Mas o cansaço, o desânimo acabou tomando conta de todos. Um a um os velhos e as crianças juntaram seus poucos pertences e foram embora da vila. Só eu fiquei aqui. Me recusei a deixar meus sonhos para trás!

_ Mas como a Senhora sobreviveu sozinha nessa vila? O que comeu? Não vi nenhum barco ancorado na praia!

_ Quando aqui fiquei sozinha, nessa vila abandonada criança, ainda era jovem, forte... Aprendi com meu pai, antes de ele se perder para o mundo; a pescar, a lavrar a terra e a costurar os tecidos que aqui ficaram abandonados por todos! Havia muitas frutas!!! Ainda sei fazer tudo isso... Não com tanta destreza de antes, pois estou ficando velha. Mas só sairei dessa vila, morta!

_Quando aqui fiquei... tinha apenas 12 anos. Agora tenho 60 anos!!! Moro aqui sozinha, há 48 anos!!! 

_ Nunca sentiu falta de companhia para conversar? Falar da vida? _ disse a criança à velhinha.

_ Acostumei-me a solidão mesmo sem querer! E quem disse que estou sozinha aqui? Deus está sempre comigo. Tenho os pássaros e os bichos por companheiros. Eles sempre me ouviram e nunca se queixaram! Sou feliz aqui! Amo essa vila, pois é o único lugar que eu conheço. Não tive marido e nem filhos. Mas conheço bem o coração de uma criança!!! E conheço também a perversidade de um homem!!!

_ Quer dizer que o "barulho do mundo" que eu escutei na grande concha hoje era real?

_ Sim linda criança! Ou o que restou dele... Esse é o segredo do "barulho do Mundo"... Só uma criança de coração puro pode escutar...

_ Aquele que é corrompido pelo ódio, pelo rancor, pela inveja, pela cobiça, não é digno de escutar o "barulho do mundo "!

_ Que linda história Senhora! Posso crescer, me tornar adulta, envelhecer; mas nunca vou esquecer essa história tão linda! Posso saber o seu nome Senhora?

_ Meu nome criança, é FELICIDADE! E o seu criança?

_ Meu nome Senhora, era Joana!!! Um nome muito comum... Mas de agora em diante, será ESPERANÇA, Senhora, eu me chamo ESPERANÇA!!!